20 setembro 2007

Odor

Era fim de tarde, hora de gente suada de trabalho pegar ônibus para voltar pra casa. E eu, nada suada, infelizmente estava no meio. Nessas horas, podemos sentir muitos cheiros, é normal. Mas, nesse dia em especial, eu podia rastrear algo diferente. Cheio de cebola. Mas, cebola, mesmo. Não cecebola, só cebola.

Eis que olho para o lado e vejo uma moça se debatendo para conseguir se manter em pé com o balanço do ônibus, que mais parece um caminhão transportando bois. Ao invés de se segurar com as duas mãos, ela usava apenas uma. Na outra, aquele pacote maldito e fedorento: Cebolitos. Que é bom, é. Mas, tudo tem sua hora. E o ônibus-cece das seis não é exatamente apropriado.

Para conseguir pegar o conteúdo fétido, ela segurava a embalagem com a mesma mão que segurava no caninho do ônibus. E com a outra, pegava umas argolinhas cebolentas. Ela comia tão verozmente que lambia os dedos após cada punhado de salgadinho. Aquilo era tão nojento, mas tão nojento, que não podia piorar. Mas, piorou.

Depois de lamber os dedos, ela segurava com a mesma mão no caninho do ônibus. Aquele caninho em que centenas de pessoas iriam segurar depois e ter contato com a baba com restos de Cebolitos. E não parou por aí. Ela não tinha sido a primeira a pegar no caninho do ônibus. Quantas pessoas não seguraram nele com a mão suja de Deus-sabe-lá-o-que?

Com a mesma mão cheia de baba de Cebolitos misturada com sujeira de procedência desconhecida, ela pegou novamente mais um punhado de salgadinho. E lambeu os dedos de novo. E repetiu isso em todo o trajeto. Quando acabou o pacote, eu já estava verde de nojo. Não queria olhar para aquela cena. Mas, era tão bizarra que eu não conseguia parar de olhar.

Ela soltou as duas mãos do caninho, amassou o pacote e jogou pela janela, na rua. Não sabia que porcos gostavam de cebola.

19 setembro 2007

Impotência

E a vontade de crescer parou. A vontade de diminuir é irrealizável. Chega uma hora em que os ramos não crescem mais. Os dias passam nas pontas dos dedos, mas é impossível alcançá-los. O jeito é correr atrás.